Tecer palavras e alinhavar textos não são atividades fáceis, há um dispêndio de energia física e emocional. Com isso,
muitos dos que se encontram no prelúdio de sua vida acadêmica, reverberam sobre
si diagnósticos de caráter deterministas diante de obstáculos epistemofílicos (BACHELARD, 1996), expressando
frases como: “eu não sei escrever”.
Essa afirmativa posiciona a escrita não apenas como um processo ao qual não se
domina, mas a desloca para a ideia de “dom”.
A escrita é um exercício que requer uma acuidade mental, mas tal processo
não nasce pronto nos indivíduos, mas sim como a resultante de um artesanal
modelamento evolutivo.
Ao elevar esse fenômeno ao contexto do PIBID (Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência), a Prof. Dr. Roca - Coordenadora do subprojeto Sociologia – percebeu a necessidade da criação de instrumentos e espaços que ajudassem os licenciandos no seu processo de aperfeiçoamento enquanto escritores. Tal diagnóstico emergiu diante da necessidade do aprimoramento dos planos e relatórios que são confeccionados.
A proposta piloto de uma oficina de escrita foi testado no VII Seminário PIBID/UFBA, onde obteve-se resultados positivos diante dos questionamentos ou mesmos desabafos dos licenciandos que compõe o programa. Foi perceptível que a criação de planos e relatórios não é um movimento mecanizado de escrita, mas permeado de carga semântica diante das experimentações que o programa proporciona.
Diante
da demanda de entregas dos relatórios referentes à 2015.1 e a produção dos
planos do segundo semestre de 2015, observou-se a importância de uma segunda
execução da oficina, já com aperfeiçoamentos constatados como necessários.
Diferentemente do piloto, onde estiveram licenciandos de diferentes cursos, a
segunda versão foi dedicada aos licenciandos de Sociologia.
No dia
10 de julho de 2015, reuniram-se para a realização da oficina representantes de
todos os setores do subprojeto: coordenação (Roca Alencar); supervisão (Wagner,
Mariana e Thiago); bem como os licensiandos (Andreia, Alissan, Neide, Pedro,
Iago, Louise, Laís, Miguel, Taiala, Rithiane, Larissa, Leonardo, Jaqueline).
Estiveram responsáveis pela execução da oficina Roberta Yoshimura
(ex-supervisora) e Thiago Neri. Ressalta-se que a atividade começou com pouco
mais de uma hora de atraso, parte do atraso se deu por conta da logística na
reserva de uma sala, mas houve também o atraso na chegada das pessoas.
A oficina foi pensada em quatro momentos
distintos, sendo o primeiro momento destinado ao compartilhamento de
experiências. Antes de dar início a esse primeiro momento, foi pedido a todos
os presentes que esquecessem qualquer hierarquia ali presente, visto que quando
o ambiente é demarcado fortemente por hierarquia, a capacidade de empoderamento
pela fala fica limitada.
Uma
crítica que já produzia ruídos nos bastidores é a data em que foi marcado o evento
(período de greve na universidade), somado aos poucos dias de intervalo entre o
anúncio do evento e sua execução. Esse caso é exemplar para uma equação que
ainda não encontrou seu equilíbrio, uma equação chamada tempo.
O
PIBID se situa na interseção dessas duas variáveis, com isso ocorre de os licenciandos
terem que produzir um relatório de um semestre escolar que ainda não se
encerrou. As tensões resultantes dessa
interseção é um conjunto de conflitos e tensões que reverberam por todo um
gradiente de situações.
Ao iniciar
as narrativas e reflexões, o primeiro ponto a ser descrito é a não-preparação
dos licenciandos que ingressam no programa, algo muito bem pontuado por
Alissan. Outra narrativa intensa foi a de Neide, pois ela relata que na
primeira reunião em que esteve presente, teve vontade de sair do programa, pois
não entendia o que ocorria, algo que acusa a necessidade de um acolhimento do
licenciando na entrada. Essa crítica só reforça a necessidade de espaços e
tempos formativos como essa oficina.
Novamente
reaparece a questão temporal, desta vez já também associada ao contexto formativo. Alguns
licenciandos, vide exemplo Iago, relata como já na sua entrada no ano de 2012,
foi designado a fazer uma intervenção em sala sem a devida orientação prévia. Ainda
sobre esse momento das primeiras intervenções houveram muitas falas, Neide
destaca como foi impactante o apoio da sua então supervisora Natália, ajudando-a a ter confiança em si nas intervenções seguintes. Outro então
supervisor citado com frequência foi Cícero, destacando-se seu incentivo e disciplina
com os licenciandos, sempre fomentado a produção acadêmica.
Uma
dada parte das narrativas foram dedicadas à comparação entre as escolas, os
licenciandos mais experientes como Miguel e Laís destacaram as condições das
escolas. Os supervisores Wagner e Mariana também destacaram suas descobertas,
sustos e temores, enquanto supervisores recém ingressos no programa. Afinal, na condição de supervisores, eles precisam orientar pessoas que nesse primeiro momento
conhecem mais o programa do que eles, sendo assim, a relação tem que ser
pautada no mais horizontal possível.
Em todas
as falas, ficou nítido que todos que ingressam no programa fizeram uso da memória
dos membros mais antigos para poder entender e se adequar ao programa.
Na segunda
etapa do programa foi abordado a necessidade de planejar, tomando como premissa
as seguintes questões: Para quem planejar? Quem planeja? Como planejar? Essas não
são questões fáceis de serem respondias. Afinal, os planos de atividade até
então não cumprem sua função principal no programa: ser um ponto de partida e mecanismo orientador.
Sendo renegado a mera etapa burocrática.
Uma das dificuldades em produzir planos eficazes é justamente o fato do planejamento não respeitar a realidade das escolas, pois os licenciandos produzem planos sem sequer saber para qual escola serão designados. Mais uma vez, a temporalidade acadêmica entra em conflito com a temporalidade escolar.
Explicitou-se
a necessidade de conhecer a realidade escolar para que se produza um planejamento operacional, também destacou-se a necessidade de entender a realidade onde a
escola está inserida, já que a escola não é uma instituição insulada. Outro
ponto relevante refere-se aos instrumentos que deveriam dialogar no momento
da produção do plano: 1- LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional),
2- PCN (Parâmetros curriculares Nacionais), 3- PPP (Plano Político Pedagógico),
4- Planejamento por área, 5-
Planejamento da disciplina. Mas não se usa todos esses instrumentos, pois
muitas das escolas sequer tem o seu PPP disponível.
Durante
a oficina, demostrou-se a necessidade de elaborar um planejamento flexível,
visto que há uma necessidade constante de aprimoramento para que o mesmo
continue sendo útil ao longo do percurso pedagógico, ao contrário do trato
burocrático que tem sido dado. Um planejamento flexível serve como instrumento
para avaliação do percurso, permite um vislumbre das etapas pedagógicas, podendo assim ajudar na mensuração da eficácia dos
processos adotados.
Alguns
dos bolsistas ressaltaram a falta de respostas do institucional do PIBID quanto aos
planos que eles produzem. Além disso, alguns dos licenciandos explicitaram a
questão das críticas nas correções, algo comum já que todo acadêmico em início
de carreira teme pelas críticas do que escreve. Becker (2011) fala
que por vezes não há tempo hábil para uma boa revisão e muitos cientistas
iniciantes são receosos de darem seus textos para os outros lerem. Ele faz questão de enfatizar o quão prolixo é
a escrita sociológica, o quanto tentamos emplumar e complexar as orações. Fato
que segundo ele, não contribui para uma boa redação e ocupa demasiado espaço do
texto. Algo que. uma boa revisão minimizaria.
Encerrou-se
essa etapa com uma espécie de pacto, onde todos os presentes esforçam-se para
uma utilização mais dinâmica e flexível de seus planos, entendendo o mesmo enquanto
parceiro de trabalho.
Após
breve intervalo, deu-se início a terceira etapa da oficina, um exercício
voltado para a construção de planos.
Divididos em duplas, as pessoas presentes foram convidadas a pensar um
plano para uma turma hipotética de uma escola também hipotética, foram
explicitadas algumas das características dessa turma a serem consideradas para
a produção do plano. Ao fim da etapa preparatória, passou-se então a narrar o
que cada dupla pensou, isso permitiu que contribuições fossem socializadas, e
que sugestões fossem feitas; Iago sugeriu que o modelo de plano poderia ser construído
de modo coletivo, sendo assim, o institucional poderia adequar o modelo para
que ele seja não submetido individualmente, mas pela equipe da escola.
A última etapa dedicou-se ao
aperfeiçoamento dos relatórios, onde se iniciou realizando um comparativo entre
os termos relatar e relatório. O primeiro sempre causa boa impressão, adoramos
relatar nosso dia, os acontecimentos que cercam nosso trabalho, nossa vida
pessoal. Contudo, o termo relatório não goza de mesmo prestígio, sempre que
pronunciado um atmosfera de algo burocrático e desnecessário se entranha na
mente e coração dos indivíduos. Será mesmo que relatório somente serve à
burocracia?
Ao pensar na Antropologia, observa-se
que esta é uma ciência que carrega o relatório em suas entranhas, pois boa
parte do caderno de campo de um antropólogo é usado para produzir relatórios;
dos achados, dos fatos, das dificuldades. Com isso, destacou-se a necessidade de
que os relatos sejam o mais fidedigno possível, pois toda ciência cresce diante
dos erros muito bem descrito e posteriormente repensados. Acrescido a isso,
promoveu-se o debate entorno do aperfeiçoamento em torno da experimentação e
observação.
As três
habilidades que precisam serem desenvolvidas para que se produza um bom relato
são: o olhar, o ouvir e o escrever. Algo muito bem apresentado e discutido por
Oliveira (2006), o autor as apresenta não como meros exercícios corriqueiros,
mas enquanto habilidades que requerem aperfeiçoamento científico.
Ao fim
da atividade, muitos dos membros do programa já havia deixado o espaço, a
realização da atividade feita em um único dia foi prejudicial, pois dedicar um
dia inteiro para essa atividade não é algo que todos puderam fazer. A partir
disso já se pode ponderar da necessidade de atividade ser dividida em dois
dias.
A necessidade de atrelar cada intervenção com
algum instrumento de avaliação foi algo discutido. É preciso desenvolver
mecanismo que possibilitem a mensuração de alcance e eficácia de cada
intervenção executada.
Destarte,
as lições deixadas pela oficina foram profundas, um gradiente epistemológico
foi percorrido. Um diagnóstico do próprio PIBID/Sociologia e a necessidade do
fomento da noção de grupo emergiram. De produto
mais intenso fica a necessidade tornar a formação algo contínuo.
Referências
BACHELARD, G. A Formação do Espírito Científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.
BECKER, H. Manual de Escrita para científicos sociales: como empezar y terminar uma tesis, um libro ou um artículo. Traducción de Teresa Arijón. 1ª ed, Buenos Aires, Siglo veintiuno editores, 2011.
OLIVEIRA, R. C. O Trabalho do Antropólogo: olhar, ouvir escrever. In: OLIVEIRA, Roberto Cardoso. O Trabalho do Antropólogo. 3 ed. Brasília: Paralelo 15; São Paulo: UNESP, p. 17-35, 2006.