O
texto que se segue é deveras artesanal, resultante de múltiplas mãos e mentes.
Com isso, apresenta uma polifonia proposital, galgando ofertar ao leitor um
gradiente de retinas que permitam leituras diversas nas mesmas laudas.
Chegada à escola
A
questão do deslocamento até o local de estudo e as dificuldades nele presente,
continuamente remetem aos cenários rurais, mas poucos tem pensado isso no
meandro urbano. Com isso, as falas de Moisés e George são de relevante leitura:
A
primeira impressão foi do difícil deslocamento para o bairro, é oferecido
transporte direto em poucas linhas e com intervalos grandes. A Estação Mussurunga
é ponto de conexão com o bairro, o coletivo retorna com intervalo de 30
minutos. Ao perguntar sobre o acesso ao Bairro da Paz constatei que para
deslocar-me da maioria dos bairros do município de Salvador até lá, faz-se
necessário uso de 2 coletivos - até a estação e num segundo momento para a
comunidade. Ainda há uma particularidade, pois, da estação saem dois tipos de
roteiros: um micro-ônibus com intervalos de 30 min, que por sua vez só cobre
parcialmente o perímetro do bairro; um ônibus grande que cumpre com outras
localidades específicas como o Areal, local onde se encontra a escola em
observação. Neste primeiro momento,
ainda desinformado dos diferentes roteiros, uma vez na estação, adentrei o
micro-ônibus o que me fez andar 20 minutos extras desembarcando numa praça e
seguindo até encontrar a escola. (Diário de Campo, 13/08/14, Moisés)
Para
testar mais uma rota que pudesse me levar mais rápido até o C. Paulo dos Anjos,
peguei um ônibus me frente ao antigo Hotel da Bahia com destino aa Estação Mussurunga,
o trajeto algo completamente insano, longo, moroso, o que me obrigou a chegar
ao local como horário estourado em quase 30 minutos, mesmo eu tendo pegado o 1º
ônibus exatamente as 15:40 e o horário de nosso encontro ser 18:00h para que
tivéssemos tempo de dar mais uma volta pelo bairro antes das atividades e dar
as boas vindas a Moisés, o novo bolsista designado para trabalhar conosco.
(Diário de Campo, 13/08/14, George)
Neste dia
(13/08/14) o clima que encontramos na escola foi de festa já que estávamos
comemorando o Dia do Estudante, os professores da unidade mantêm uma atmosfera
agradável de muita descontração e receptividade para conosco. Essa data também
marcava o primeiro contato de Moisés com a escola, sobre isso nos disse ele:
Já na escola pude ter o primeiro contato com a sala dos
professores, por sinal, bastante movimentada pela troca do turno vespertino
para o noturno. Nesse momento, os professores estavam compartilhando um lanche oferecido
pela direção da escola para um evento seminal que teria como tema a trajetória
dos estudantes enquanto cidadãos. (Diário de Campo, 13/08/14, Moisés)
Um rolê nas quebradas
Acompanhados
do supervisor do programa de iniciação à docência, que é também professor e
morador da comunidade, foi possível conhecer com mais especificidade as ruas,
becos e vielas da localidade dando substância para uma percepção menos
superficial do espaço relacional do bairro e podendo fazer considerações sobre
o modo de vida dos diferentes sub grupos que começaram a ser delineados ante
nossos olhos.
Pudemos ver que o bairro apesar do que
se pensa, mantem certa infraestrutura que permite a manutenção de seus
moradores, comércio forte e diversificado, templos religiosos de diversas
denominações e credos, somados aos projetos sociais. Sobre transporte ainda
comenta George:
Comentei
com Thiago sobre a relação do motorista do ônibus que me conduziu em relação às
crianças e aos estudantes do bairro, falando com todas, permitindo o acesso
pela porta dianteira sem cobrar a condução, isso foi algo que me chamou
atenção, o que Thiago disse ser comum haja vista que dada a quantidade reduzida
de transporte público os moradores acabam por conhecer todos os motoristas e
cobradores das linhas de ônibus que atendem o bairro. (Diário de Campo,
13/08/14, George)
Como os demais aparelhos urbanos
precários do bairro, as vias são bastante estreitas e têm um fluxo baixo de trânsito
de automóveis. Isso possibilita que as pessoas se desloquem pela pista.
Trata-se de um bairro periférico que ainda sofre com
muitos estigmas, onde muitos ainda enxergam como local perigoso e ameaçador mas
não, a realidade encontrada não se diferencia muitos dos bairros periféricos de
Salvador, que sofrem com o descaso por muitas vezes das autoridades e convivem
com problemas sociais.
Nesse ponto, o Bairro da Paz reflete um
processo que pode ser verificado em diversas partes da cidade de Salvador: o
crescimento da renda e do poder de consumo trouxe consigo um número muito
grande de pequenos negócios que atendem às demandas cada vez mais crescentes.
Pode-se perceber uma ampla gama de lojas que vendiam os mais diversos produtos
como acessórios de celular, academia, oficinas, além dos já tradicionais
“mercadinhos”, alguns de tamanho considerável.
Pelo
horário, encontramos pessoas na rua realizando as mais diversas atividades:
indo e voltando para o colégio, faculdade, tomando conta dos comércios,
brincando, bebendo, conversando, trabalhando. Enfim, nos disse Miguel:
eu pude perceber que há uma vida
muito intensa nos lugares que passei. O que contrastou com o início e o final
do trajeto que fizemos, pois seria mais uma parte residencial, com as casas
geralmente de luzes acesas e portas fechadas. Nessas duas partes o número de
pessoas na rua era muito pequeno. (Diário de Campo, 13/08/14, Miguel)
Cabe salientar que nesse momento de fervor político,
as melhorias urbanas como a requalificação de praças, drenagem de córregos,
implementação de unidades sanitárias, melhorias habitacionais é nítida, por
todos os lados são banners e carros de som dos candidatos, de fato algumas
práticas políticas não mudam com o tempo.
Novamente
na escola, pôde-se conhecer as instalações bastante amplas, bem ventiladas e de
pouca poluição visual, bem como a acessibilidade plena para cadeirantes
portadores de necessidades especiais em todos os pavimentos – detalhe curioso,
pois, é incomum para escolas de periferia.
Atividade
do dia do estudante
Abdicando da intervenção preparada previamente,
a equipe do PIBID voltou à escola após percorrer rapidamente o bairro, com o
intuito de participar da atividade do dia do estudante:
Ao retornarmos à escola, comemos do mesmo lanche que os alunos e
após a refeição, fomos para a aplicação da atividade; cada professor da escola
ficou com uma turma e nesta turma ele deveria ajudar a turma a fazer um cartaz
com os anseios, desejos e sonhos dos estudantes. (Diário de Campo, 13/08/14,
Zósimo)
Nos
bolsistas do PIBID ficamos divididos nas duas turmas que trabalhamos no CEMPA - o 3ºNA e 3ºNB. Durante os 45 minutos de
confecção dos cartazes, auxiliamos e ajudamos os estudantes, tanto na colagem
quanto na elaboração das falas das apresentações que seriam feitas no
auditório.
Faltava material, faltavam
ideias, mas principalmente, faltava vontade. Uma das turmas chegou a se recusar
a produzir o cartaz alegando que não houve um preparo para desenvolver uma
atividade nesse sentido, junto com Thiago, acabamos nos envolvendo o máximo que
podíamos, tudo para fazer com que as turmas com que trabalhamos não ficassem
completamente apáticas.
Thiago correu a escola em
busca de jornais e revistas para que se pudessem ser feitos recortes, na turma
onde não pudemos encontrar material para trabalhar, sugerimos que a turma
usa-se palavras chaves, como metas a serem alcançadas tendo como base as
oportunidades que podem ser criadas através da educação.
Após a confecção dos cartazes, direcionamo-nos ao auditório do CEMPA para as
apresentações dos cartazes de todas as turmas do turno da noite.
Em seguida os alunos assistiram a uma palestra e os
grupos de hip-hop e a banda composta pelos alunos da escola também se
apresentaram, de forma geral foi uma excelente iniciativa já que nas
entrelinhas buscou-se dar evidência aos alunos e tira-los da zona de conforto
propondo atividades diferentes que conseguem de fato mudar a rotina do local.
Trocando
uma ideia
O Planejamento é algo fundamental à prática docente,
sendo esta uma prática que demonstra o respeito do professor, enquanto
profissional, para com o aluno. Muitas vezes, abdicamos de algumas questões
pelo simples fato de receber ordens e não de que aquilo talvez tenha sido
melhor.
Acho que falo por todos quando digo que a sensação foi frustrante,
frustrante por mais uma vez percebermos que a educação é o potencial para modificar
vidas, mas que para que essas modificações ocorram, é preciso de muita coisa,
mas o elemento principal, VONTADE. (Diário de Campo, 13/08/14, George)
O
C.E.M.P.A tem duas coisas boas, um material humano maravilhoso que quando
estimulado produz com qualidade, e um núcleo do Pibid-Sociologia comprometido
com essas pessoas, saímos do colégio por volta as 20:00 horas pois o “evento”
continuaria no auditório principal da escola com as turmas reunidas e a
apresentação dos “cartazes” que tinham sido produzidos minutos antes, voltamos
no ônibus pensando e discutindo muitas coisas
* texto escrito de forma conjunta por Thiago Neri, George Hora, Priscila Menezes, Miguel Pereira, Moisés e Zósimo Ferreira