11 de nov. de 2015

Postado por PIBID Sociologia UFBA
| quarta-feira, novembro 11, 2015
A discussão acerca da distinção entre os conceitos de “diferença” e “desigualdade” nos papeis sociais de gênero e raça é de total relevância no ambiente escolar como apresenta Pimenta (2010), visto que é preciso prezar por uma formação cidadã dos educandos. Partindo dessa premissa, o PIBID/Sociologia percebeu a necessidade da problematização no ambiente escolar da existência das diferenças sociais, bem como as desigualdades ideológicas existentes em torno delas. Para tal, enquanto metodologia foi pensada uma atividade que fornecesse ao educando espaço de crítica e dinamismo. Ela consistiu em: 1) oito estudantes receberam um papel com um personagem que eles iriam interpretar; 2) os bolsistas organizaram esses estudantes em uma linha horizontal, como linha de partida de uma corrida; 3) os bolsistas disseram situações voltadas para o cotidiano dos estudantes; 4) os estudantes que representam personagens privilegiados naquela determinada situação darão um passo à frente, os desprivilegiados darão um passo para trás.
Essa intervenção tencionou enfatizar as descriminações, preconceitos e desigualdades entre as pessoas a partir da etnia e de gênero, dado que personagens são caracterizados unicamente por esses elementos. São eles: mulher negra gay, mulher branca gay, mulher negra heterossexual, mulher branca heterossexual, homem negro gay, homem branco gay, homem negro heterossexual, homem branco heterossexual.



A atividade foi feita com as turmas A, B, C, D e E do segundo ano do ensino médio, no turno matutino do Colégio Estadual Duque de Caxias, colégio localizado no bairro da Liberdade em Salvador, pelos licenciandos Rômulo Santos, Rithiane Almeida e Zósimo Ferreira, com a supervisão da professora Mariana Bittencourt. Iniciando a atividade, a primeira dificuldade foi conseguir colocar os oito educandos em linha dentro do pouco espaço da sala de aula. Após isso, os papéis dos personagens foram entregues e, de imediato, começaram as brincadeiras com quem pegou personagens gays. Risos e pessoas querendo esconder ou trocar o papel.
 A cada situação lida, os educandos discutiam se daria um passo para frente ou para trás. Os educandos que estavam com os personagens de negro/negra gay sempre ponderavam sobre sua participação: "pode quebrar a parede do fundo da sala? Por que eu só vou andar pra trás", e os demais estudantes também observavam: "coitada da negra gay", sempre com alguns risos. Nas situações que tinham violência como tema, os estudantes que estavam com os personagens negros sempre davam os passos para trás assim que a situação era lida, sem nem sequer esperar a discussão em sala, argumentando que andavam logo por que “negro sempre se dá mal”.
Durante as discussões, é necessário salientar a situação “tenho maiores chances de ser abordado pela polícia na rua” em que vários educandos pontuaram que ocorriam em seus cotidianos, que percebiam que os homens gays que são “mais afeminados”, independente da cor, não são abordados pela polícia na rua enquanto outros falavam que a orientação sexual não era importante e sim a etnia para que uma pessoa fosse abordada pelos policiais.
É preciso também destacar as situações que discutiam adoção e religião nas quais alguns estudantes argumentaram que negros podem ter menos dificuldade que os gays, mas são nitidamente segunda opção para adoção de crianças se existir um casal branco com interesse, bem como as crianças negras tem mais dificuldade para serem adotadas. Em relação à religião, mesmo entendendo o quanto as religiões de matriz africana são marginalizadas, os educandos apontaram que existem algumas relações que podem desprivilegiar algumas religiões que são privilegiadas em outros momentos, como estereótipos criados de que evangélicos são todos chatos, conservadores e preconceituosos.



Situações que versavam sobre educação também foram intensamente debatidas, e os educandos sempre traziam à baila a questão das cotas, como a maneira pela qual os negros tinham exatamente o mesmo acesso, alguns favoráveis às cotas e outros não. Pontuavam assim, que não existiam privilegiados. Outros ainda ressaltaram a qualidade do ensino público e do ensino privado, e como isso garantia um acesso facilitado à universidade, outros consideravam que isso dizia respeito muito mais ao indivíduo, que dependia do esforço de cada um.
Ao fim das situações, em todas as turmas, a personagem “homem branco heterossexual” ficou na frente, com mais privilégios, e a “mulher negra gay” ficou em último, mais desprivilegiado. Como diz Paulo Freire (1991), a leitura de mundo precede a leitura escrita. Coube aos licenciandos, escutar como os educandos liam essas situações de privilégio e exclusão em suas vidas os colocando como personagens dentro das situações usadas durante a atividade. Ao chegar na conclusão, a discussão prosseguia, de maneira bastante intensa em nas turmas. Alguns educandos além de perceber a diferença nos privilégios, sempre se viam inclusos nos grupos que deram mais passos para trás. Além perceberem como é que eles compreendem, leem e lidam com as situações de privilégio ou desprivilégio, os bolsistas tiveram a chance de se aproximar mais ainda da turma, se posicionando também enquanto integrantes dos grupos privilegiados. Quando se identificavam como moradores do interior, moradores de bairros periféricos, negros como os demais educandos, uma relação de maior empatia surgiu entre os educandos e os licenciandos, o que foi extremamente positivo.
A atividade terminou então com a reflexão da quão preconceituosa e segregacionista é a nossa sociedade e como todos nós reproduzimos essa ideologia em nossas vidas muitas vezes sem nem perceber o que estamos fazendo.



Referências Bibliográficas

FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 26 ed. São Paulo: Cortez, 1991.
GIDDENS, Anthony. Sociologia. 6 ed. Porto Alegre: Penso, 2012.
PIMENTA, Melissa de Mattos. Diferença e desigualdade. Sociologia: ensino médio. Coordenação Amaury César Moraes. Brasília, 2010.

SILVA, Afrânio et al. Sociologia em movimento. 1 ed. São Paulo: Moderna, 2013.