11 de mai. de 2015

Postado por PIBID Sociologia UFBA
| segunda-feira, maio 11, 2015
Primeiras impressões: relato de visita dos licenciados ao Colégio Mestre Paulo dos Anjos
David Demaio Neto
Larissa Lima Santos
Leonardo Lima Santos
Pedro Fragoso Costa Júnior
Rômulo Iago de Jesus e Santos
Thiago Neri

Os ensinamentos da etnografia demonstram que não basta apenas cercar um objeto, é preciso entrar nele. Com isso, a proposta do PIBID tem um eficaz alinhamento, pois sua metodologia propõe o contato contínuo com os educandos, permitindo assim trocas contínuas e intensas com os licenciandos e supervisores.
Esse texto foi construído por seus idealizadores para fazer um convite: pise em minhas pegadas. Com isso, a pretensão é compartilhar múltiplos olhares, mas não um olhar despretensioso, ao contrário, trata-se de um olhar disciplinado (OLIVEIRA, 2006). O que se apresenta a partir de agora são contribuições agudas e intensas.
A dificuldade da distância, já esperada, repetiu-se como não poderia deixar de ser. O colégio é longe se tomarmos a UFBA como referencial, mas não é nada que atrapalhe o trabalho. Entretanto, ressalta-se que foram necessários dois ônibus para chegar ao colégio e demoramos pouco mais de 1,5 h pra chegar ao destino. Mas, o tempo de viagem não foi o que mais chamou atenção. O que se destacou aos olhos de todos foi o fato de o segundo ônibus não fazer parte do sistema de integração da prefeitura, o que fez com que pagássemos os dois transportes que pegamos, ao invés de um só.
Ao descer do segundo ônibus, caminhamos até o final de uma rua e chegamos ao colégio. Ao chegar, fomos direto para a sala dos professores para esperar que o resto do grupo chegasse para que conhecêssemos a estrutura do colégio e sua localidade. Destaque aqui para a “colmeia CEMPA”. A sala dos professores foi decorada com umas ilustrações meio juvenis de abelhas que formavam a colmeia que seria o colégio. Cada professor é uma abelhinha que está desenhada ao lado dos seus nomes nas portas dos armários. A sensação de retorno a infância por causa das ilustrações foi inevitável, mas não se pode deixar de ver o quanto essa ideia de “colmeia CEMPA” mostra que todos devem trabalhar juntos para que o colégio prospere como as abelhas fazem por sua casa.

A escola de fato me surpreendeu. Pensei que seria uma escola comum ao que nós vemos por aí. É uma escola que tem muito boa estrutura fisicamente. Conheci alguns professores, que foram bem educados e brincalhões com a gente (os bolsistas). (Leonardo, licenciando/Sociologia)

Contudo, chama atenção um espaço grande da escola que é inutilizado, pois é mato, e que poderia servir de espaço de lazer. É importante salientar que durante a noite as muriçocas invadem o colégio, principalmente os banheiros. As salas de aula possuem televisão, mas segundo Thiago elas não funcionam. A biblioteca está sendo reestruturada e está com um bom acervo pelo que deu pra perceber ao primeiro olhar, contudo ainda está pouco ventilada.
Diante de uma abordagem sociológica, não basta apenas conhecer a escola, precisa-se conhecer onde ela se encontra: desenterrar suas raízes. Sendo assim, conhecer o bairro por meio de uma longa caminhada é um modo artesanal e eficaz de produção sociológica (MILLS, 1982). Uma forma adequada de melhorar a educação é sabendo a quem se deseja educar.
O Bairro da Paz tem uma característica especial diante de tantos outros bairros periféricos da cidade, ele representa uma resistência constante por ser localizado numa região de especulação imobiliária muito grande, tanto é que existe um condomínio de classe média ao lado do bairro. Desde então, é bom ressaltar que o Bairro da Paz representa a resistência viva, pulsando na cidade.

O bairro é uma coisa impressionante. É muito claro as contradições sociais no Bairro da Paz, mas com a beleza escondida, que a gentileza do povo nos mostrou. Começamos a andar por uma rua de chão, onde é acompanhada de um córrego de esgoto; que por conta disso tem muitas muriçocas em todo bairro. (Leonardo, licenciando/Sociologia)
No início do trajeto passamos por ruas de barro, com casas mal construídas, algumas até de madeirite, e com pessoas que pareciam viver em situação de pobreza quase que extrema. Podemos ver como as pessoas trabalham com reciclagem para tentar sobreviver. As casas ficam todas perto de um grande rio que virou esgoto que nos acompanhou em todo o trajeto. A visão não me surpreendeu, já tinha visto pessoas naquela situação anteriormente, entretanto, me comoveu, principalmente as das casas de madeirite. Provoca uma pausa pra pensar, mais uma vez, como deve ser viver nessas circunstancias em que você não sabe se sua casa vai resistir à próxima chuva. Que, caso resista à chuva, a casa estará inundada de esgoto quando a chuva passar.  (Rômulo Iago, licenciando/Sociologia)
Nessa mesma rua observei residências simples e pessoas humildes na rua, dialogando, algumas nos olhando como se questionasse o porquê de estarmos entrando naquela rua que nada tinha a oferecer de interessante. Durante todo percurso o Thiago é cumprimentado por alguns alunos, ex- alunos, e amigos, já que ele além de trabalhar no CEMPA é também morador do bairro. Percebemos alguns moradores queimando materiais para produzir fumaça com o intuito de afastar a presença de muriçocas que estão incomodando a região, inclusive dentro do próprio CEMPA. No chão de barro percebi crianças correndo, se divertindo, e chegando mais à frente há uma criança próximo a dois enormes latões de lixo olhando para o céu, disperso. No momento, me causou um impacto essa imagem refletindo a realidade de uma inocente criança no estado em que se vive com os grandes prédio residenciais do outro lado do grande córrego coberto por considerável quantidade de matos (Pedro, licenciando/Sociologia).
        Já foi possível ver a efervescência do comércio no local com supermercado, lojas de roupas, sapatos, bolsas e etc. Desde a rua anterior, já notamos uma diferenciação nas casas. Elas já começam a ter mais estrutura, já são visivelmente bem mais arrumadas e mostram uma situação de vida muito melhor do que a das primeiras ruas. Seguimos então pela rua principal rumo à escola novamente. Passamos por uma creche e por uma escola particular. Pudemos ver duas realidades diferentes do bairro que já tinha sido mais ou menos mostrada pra gente através do documentário “Malvinas: do outro lado da ocupação”. O destaque para essa segunda parte do trajeto foi uma quantidade considerável de policiais com suas viaturas na praça principal, todos com porte de grandes armas. Tinha a presença da RONDESP (Rondas Especiais).
       Depois do passeio por algumas vias, voltamos para a escola, local este que fica afastado do centro comercial do bairro. Conhecemos a sala dos professores e alguns destes, ficamos durante uma hora conversando acerca da vida cotidiana e aspectos relacionados à educação no bairro, sobre os jovens que trabalham e estudam à noite, da estrutura da escola e tantas outras coisas relacionadas ao aprendizado e educação. Após esta conversa, nos reunimos na biblioteca do colégio para discutir sobre o PIBID sociologia no colégio.
Thiago nos apresentou as turmas de aula do noturno, muitas estavam com metade dos alunos, devido ao feriadão da semana santa. Os/as estudantes são acolhedores/as. Saí de lá bastante empolgada e com vontade de voltar logo e começar de fato as atividades presenciais do PIBID. Foi bastante forte uma das frases em que Thiago mencionou: que a gente só alimenta essa paixão por ensinar justamente pelos/as alunos/as, em oposição à toda burocracia, das estruturas pouco mutáveis e de alguns colegas que acabam se desmotivando e se acomodando e esquecendo a libertação e autonomia que a educação proporciona ou deveria proporcionar.  (Larissa, licencianda/Sociologia)

Encerradas as atividades na escola, todos podem voltar pra casa com suas questões nefrálgicas de educadores em formação. Mais que cansaço, todos levam consigo muitas descobertas, mas não muitas respostas e sim várias interrogações. Algo de extrema importância, pois ensinar não é saber todas as respostas, mas sim um questionar contínuo.


MILLS, C. W. A Imaginação sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
OLIVEIRA, R. C. O Trabalho do Antropólogo: olhar, ouvir escrever. In: OLIVEIRA, Roberto Cardoso. O Trabalho do Antropólogo. 3 ed. Brasília: Paralelo 15; São Paulo: UNESP, p. 17-35, 2006.